quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Design rupestre da Serra da Capivara dribla a miséria e a depredação ambiental

Na zona de transição entre a Caatinga e o Cerrado, localizado no entorno do Parque Nacional Serra da Capivara, no Piauí, uma comunidade rural de Barreirinho encontrou um caminho para driblar o cenário de miséria, prostituição e depredação do meio ambiente. O programa Cerâmica Artesanal Serra da Capivara emprega a população local na produção de peças, como louças e vasos, decoradas com símbolos semelhantes às pinturas rupestres desse sítio arqueológico brasileiro.

"Esse trabalho existe há 13 anos. No início, eram apenas três pessoas da comunidade Barreirinho trabalhando junto com a equipe, mas agora já temos 27 artesãos na oficina, o que corresponde a 70% da comunidade", conta Girleide Oliveira, administradora do projeto de Cerâmica Artesanal da Serra da Capivara. "Nossa principal motivação foi possibilitar às pessoas que moravam no entorno do Parque uma fonte de renda, diminuindo assim a depredação da fauna e da flora características da caatinga e do patrimônio cultural do Parque, que são as pinturas rupestres e os vestígios arqueológicos."

As peças da Serra da Capivara são vendidas em oito Estados brasileiros e exportadas para a Itália. Há negociações para que cheguem também à Holanda e à Grécia. Com o apoio da Fundação Museu do Homem Americano (FUMDHAM), entidade presidida pela arqueóloga Niéde Guidon, o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) ajudou a capacitar os antigos caçadores e agricultores para a função de ceramista, buscando um resgate cultural em suas raízes e visitando museus para começar a dar um novo formato aos produtos confeccionados.

Na produção de suas peças, a Cerâmica Serra da Capivara tem a preocupação de retratar a cultura local em dois níveis: no design e nas técnicas de fabricação. No primeiro caso, desde a pré-história os povos que habitavam essa região trabalhavam com argila na fabricação de cerâmica com finalidades diversas, como urnas funerárias e peças utilitárias, como comprovam as pesquisas arqueológicas na região. Foi uma opção consciente retratar nas peças réplicas das pinturas rupestres encontras nos paredões que formam o grande patrimônio cultural, já tombado pela UNESCO, do maior complexo de sítios arqueológico das Américas. "O trabalho desenvolvido pelos artesãos tem beleza, funcionalidade e também o valor social agregado que contribui com o desenvolvimento da região e protege o patrimônio cultural e ecológico do Parque", conta Girleide.

Nesse processo de transição, os fornos passaram a ser aquecidos a gás levado por caminhões contratados, o que reduziu a pressão sobre a madeira da área de preservação. E o uso da argila para a produção das peças artesanais é menos comprometedor ao meio ambiente do que a instalação de uma pedreira ou saibreira.

"Em relação às questões ambientais e sociais, todas as peças estão sob rígidas normas de fabricação, que é feita de acordo com normas da Licença Ambiental, emitida pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (IBAMA), órgão que fiscaliza periodicamente o funcionamento da cerâmica. Há também o manual de Boas Práticas de Fabricação e Controle, emitido pelos órgãos responsáveis pelo cuidado com a saúde humana", explica a administradora.

Prêmio pela sustentabilidade

Em 2005, a Cerâmica Serra da Capivara conquistou o primeiro lugar de melhor projeto de sustentabilidade do Brasil, premiação concedida pelo Conselho Empresarial Brasileiro de Desenvolvimento Sustentável (CEBDES). "Os R$ 10 mil que ganhamos foram utilizados em benefício do projeto. Recuperamos equipamentos, compramos novas máquinas e com o restante fizemos uma confraternização com todos os integrantes do projeto e sorteamos vários prêmios. Foi uma luta grande, mas enfim conseguimos este certificado. Isso deu mais valor às nossas peças. Além disso, conseguimos também nos firmar perante a Comunidade Européia de Artesanato", diz Girleide.

Atualmente, o projeto trabalha com capacitação para outras comunidades e grupos que tenham o mesmo potencial de atuação da Cerâmica Artesanal. "Todos os esforços somados no funcionamento da Cerâmica nos deram um grau de qualidade muito satisfatório, porque estamos valorizando as pinturas rupestres, a caatinga e contribuindo com a sustentabilidade dos moradores da região. Estamos consolidando a identidade do povo sertanejo e nordestino e vamos continuar nessa linha: politicamente corretos, ecologicamente perfeitos e socialmente justos", avalia ela.

A maior parte da produção das peças é vendida no Brasil, em grandes redes de lojas de decorações nos principais Estados. A rede Tok&Stock comercializa os produtos de Cerâmica da Serra do Capivara desde 2002. Os produtos fazem parte da Linha Rupestra e já foram vendidas mais de 80 mil peças de 13 itens diferentes. "Fomos apresentados ao projeto pela designer brasiliense Cristiane Dias, que escolheu a cerâmica rupestre como tema do seu mestrado na escola de design Central Saint Martins College of Art and Design, em Londres. Imediatamente aceitamos ser o canal de distribuição nacional", relembra Edson Coutinho, coordenador de tendências da Tok&Stock.

Segundo ele, a Linha Rupestra faz sucesso desde o seu lançamento. No início, a rede oferecia seis itens da linha jantar, mas a grande procura os levou a ampliar a linha e encomendar a criação de acessórios para banheiro, vasos e outras opções para a linha mesa. "Até uma linha de lençóis lançamos com a assinatura da Cristiane e os característicos desenhos rupestres. O trabalho desta designer foi fundamental para que tivéssemos esses produtos ao mesmo tempo adaptados à vida contemporânea e embebidos de valores históricos e culturais. A linha Rupestra se tornou uma referência do design nacional", diz Coutinho.

Para contribuir com a valorização das peças, a Tok&Stok, segundo Coutinho, investe na divulgação da Linha Rupestra no site e na revista da loja, além de outros meios de comunicação. "Hoje estamos desenvolvendo uma linha nova para a renovação destes produtos. Esta linha também será produzida na Serra da Capivara e a designer Cristiane Dias nos surpreenderá com outros aspectos culturais a serem valorizados da região. Desta forma, o projeto não morrerá e continuará a crescer e principalmente, a ser sustentável", acredita Edson Coutinho.

Além da distribuição em lojas e da exportação, a Cerâmica Artesanal Serra da Capivara também produz, sob encomenda, peças para brindes personalizados, utilitários e decorativos.

Para saber mais sobre a Cerâmica Artesanal Serra da Capivara, acesse: http://www.ceramicacapivara.com/

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